Entre Fronteiras
Uma linha imaginária foi desenhada para dividir o planeta que conhecemos como Terra ao meio. Seu desenho tornou-se tão presente em nossas vidas que esquecemos que a linha do Equador de fato não existe, mas que sua invenção é um serviço para a divisão dos hemisférios norte e sul e inevitavelmente, na divisão sócio-econômica entre dois blocos. Através de aspectos que ressaltaram a diferença e as desigualdades, tais como "grandeza econômica" e "desenvolvimento", as distinções que se atribuíram à divisão dos hemisférios contradizem o significado do nome "Equador". A palavra, que deriva-se do latim medieval em suas primeiras aparições queria dizer "igual" e/ou "equivalente". Na sua raiz etimológica, Equador fazia referência ao círculo imaginário que equaliza dia e noite, apontando para uma potência análoga: a correspondência dos semelhantes.
A exposição Entre Fronteiras convida o público a navegar pelos territórios ampliados da arte, habitando as margens borradas dos inconscientes femininos. As artistas que participam de Entre Fronteiras expressam com linguagens particulares suas relações com o desejo, a censura, a violência, a vigília, o delírio, as fabulações e a narrativa. Por meio de plasticidades como pintura, desenho, colagem, bordado, assemblage, fotografia e vídeo, cada artista constrói imagens que buscam uma nova cartografia para o corpo e deflagram uma certa desistência em sobrecarregar-se diante do peso imensurável do mundo. Quando eu era criança, sempre me perguntava onde moravam os sonhos porque parecia impossível que eles coubessem dentro da gente. Tão vastos e coloridos, aventuras intermináveis ou pesadelos assustadores, sonhando com amigos ou desconhecidos, sempre voltava a questão: o que é essa vida dentro da gente, dentro da nossa vida? Os sonhos podem trazer a certeza de que somos plurais, e que dentro de nós existem muitas de nós, quando podemos nos reconhecer como outras, desenhando retratos inventados que se abrigam entre os extratos de memórias. Sonhando acordadas, mulheres nas mais diferentes épocas e contextos enfrentaram os jogos de poder com a coragem de quem antevê um futuro de equidade, amor e respeito. É preciso cuidar para não desistir diante de divisas que impedem os fluxos da criação, promovendo nas fissuras a expansão dos imaginários de resistência. Tornar-se mulher em força de vida, força de luta, sabendo que a luta é contínua e que dentro dos sonhos acolhemos as possibilidades de produzir territórios de liberdade.
Bianca Bernardo